Da Suíça, uma má notícia - Henrique Sousa
19-10-2015 11:28
Da Suíça, uma má notícia - eleições dão mais força à direita:
Os resultados das eleições para o parlamento federal suíço em 18 de Outubro (duas câmaras: conselho nacional, deputados representantes do povo suíço; conselho dos estados, representantes dos cantões) confirmaram uma maior polarização política, com o reforço em votos e em deputados do partido da extrema-direita (a UDC) - o mais votado, com 29% - e de outro partido da direita (os liberais radicais, aliados frequentes da UDC) que obteve 16%. Os partidos do centro-direita recuaram fortemente, o PS foi o segundo partido mais votado (mantendo a votação em 18,8%, mas perdendo 5 deputados), e os ecologistas recuaram fortemente, perdendo 10 deputados. A esquerda radical (PST-POP) conseguiu a eleição de um deputado para o conselho nacional, em Neuchatel, passando a ter representação parlamentar.
Para o conselho dos estados, os resultados da primeira volta deram também vantagem à direita e extrema-direita, ficando os resultados finais dependentes da segunda volta, em Novembro. Sendo apesar de tudo provável que neste órgão se verifique um maior equilíbrio entre representantes da esquerda e do centro-esquerda social-democrata e ecologista, do centro-direita e da direita.
De sublinhar também, como por cá, o crescimento da abstenção, num país em que, apesar da intensidade do debate político e das oportunidades de participação (é o país dos referendos, nacionais, cantonais e comunais) votaram menos de metade dos eleitores (48,4%).
Os resultados ameaçam afectar fortemente a composição e o equilíbrio histórico do conselho federal, o governo suíço, constituído por sete ministros eleitos pelo parlamento (reunião conjunta das duas câmaras), de entre os quais é eleito anualmente o presidente da confederação, com funções de representação e sem poderes especiais.
O conselho federal, segundo regra não escrita mas decorrente da história e das características institucionais suíças, é constituído pelos representantes dos principais partidos suíço numa proporção que poderá ser agora abalada pelo crescimento da extrema-direita e da direita. A UDC reclama já a eleição de um segundo representante seu para este órgão, à custa dos lugares dos outros partidos aí representados (dois socialistas, dois liberais-radicais da direita, dois do centro-direita: um burguês-democrata e um democrata-cristão).
O progresso da direita e da extrema-direita, que reúnem agora 101 dos 200 deputados do conselho nacional, tem evidente relação com a exploração hábil que fizeram da crescente inquietação dos suíços com a pressão migratória e dos refugiados. Num país onde apesar de tudo deve ser sublinhada a capacidade revelada até agora de integração e acomodação de um número excepcional de emigrantes e de estrangeiros, e cuja economia depende fortemente deles e deixaria de funcionar sem eles. E onde a esquerda e o centro-esquerda não têm conseguido afirmar uma resposta eficaz e popular aos problemas e inquietações sociais nem têm demonstrado capacidade de mobilização política equivalente à da extrema-direita. Que têm sabido jogar, num país desenvolvido de elevados rendimentos, com a defesa nacionalista do modo de vida, das instituições e da cultura suíça, do proteccionismo e do combate à adesão à União Europeia, combinando isso eficazmente com a exigência de uma política xenófoba e de fechamento aos emigrantes e de defesa exacerbada do neoliberalismo económico.
O carácter historicamente original do sistema político suíço, em que a estrutura federal se combina com uma forte autonomia dos cantões dotados de constituição, governo e parlamento próprios, tendo um governo em que participam todos os principais partidos e contendo níveis elevados e descentralizados de participação política, mantém potencialidades que devem ser valorizadas para a defesa da democracia e de contenção de uma extrema-direita cujo sucesso e limites devem também ser compreendidos no quadro muito específico da realidade suíça.
Estas eleições são também mais um aviso sério de que, perante a força excepcional dos desafios e dos adversários que a democracia e as alternativas progressistas defrontam na era do capitalismo financeirizado, mediático e global, precisamos muito de juntar forças e superar velhas barreiras e muros à esquerda. Porque isto está mesmo difícil!
Henrique Sousa
19/10/2015
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