Rendeiros - Sandro Mendonça

02-10-2012 15:44

Portugal é o país mais pobre da Europa ocidental. É também o mais desigual.

Neste contexto, sem saber como a pôr a economia a crescer, o governo lá pensou em mexer na TSU. Tudo isto para colocar dinheiro nos bolsos das empresas. Note-se: há aqui uma tendência para um desiquilíbrio de responsabilização que jamais foi positivo para a economia como um todo. Primeiro exemplo. Esqueceram-se os ‘advisors' do que aconteceu quando nos governos de Cavaco choveram benesses europeias sobre patrões e agrários? Resposta: desbaratou-se o dinheiro em carros de luxo e piscinas.

Outro exemplo. A taxa geral de IRC era de 36,5% aquando da reforma fiscal de 1988. Em 2012 já era 25%. Nova pergunta para os ‘advisors' deste governo: e o crescimento, meus caros? Resposta: nem vê-lo. Ainda pior é que em Portugal a maior parte das empresas diz ter prejuízo. E em boa parte daquelas que dão lucro este não é reinvestido, mas sim entregue rapidamente a donos e gerentes ficando desiquilibradas financeiramente. Demasiadas empresas neste país são geridas à antiga, como colónias: são terras para explorar onde há trabalhadores para extorquir. Os ‘advisors' saberão para quem vai o excendente: é para os rendeiros. E aqui chegámos: a uma repartição desfuncional do rendimento.

Veja-se o Global Wealth Report 2012 da Allianz: Portugal é o 19º país com mais activos financeiros brutos, uns incríveis 384 mil milhões de Euros. Riqueza que o Banco de Portugal já revelou este Verão estar muito mal distribuída. O relatório Mercer sobre remunerações só mostra como as coisas estão a piorar: os próprios salários são cada vez mais desiguais, num país sem resultados os directores de primeira linha continuam a flutuar acima da performance das suas organizações.

Basta de cortes sempre e só para o mesmo lado. Uma taxa sobre as transacções financeiras tem de ser imposta sobre a actividades sem valor para a economia real: menos especulação e menos volatilidade é preciso. O escalão máximo de IRS tem de voltar aos níveis da OCDE pré-Tatcher e pré-Reagan: nessa altura a taxa andava pelos 80% no Reino Unido e nos EUA. Se isto for encarado como um desincentivo tanto melhor. O negócio dos rendeiros faz mal à economia. E à sociedade.

Sandro Mendonça, Economista do ISCTE-IUL (Texto publico no Diário Económico e reproduzido em attac.pt com a autorização do autor)



 

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